quarta-feira, 3 de outubro de 2007

AGRICULTORES QUE MORAVAM NA BOLÍVIA OCUPARAM SEDE DO INCRA NO ACRE

sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Brasiléia (AC) foi ocupada nesta terça-feira (02/10) por 30 famílias de trabalhadores rurais sem-terra que residiam no seringal Porto Rico, na Bolívia. A vinda das famílias concretiza uma situação de crise que se arrasta há quase dois anos, tendo como pano de fundo as ameaças do governo boliviano de promover uma nacionalização adotando medidas para dificultar a permanência de trabalhadores brasileiros na região.

Essas intenções estão cada vez mais evidentes nas mais variadas formas de pressões que as famílias de brasileiros que residem na faixa de fronteira vêm sofrendo nos últimos meses. Entre as mais graves, a exigência pela naturalização boliviana e a cobrança do imposto para permanência, sendo 1.015 bolivianos por pessoa no primeiro ano.

A expectativa é de que pelo menos mais 30 famílias de brasileiros que residem no Porto Rico retornem para Brasiléia nos próximos dias, reivindicando o justo abrigo no país de origem e ações da Reforma Agrária na garantia do direito à terra.

Retaliações

Além disso, conforme relatou a trabalhadora rural Marilene dos Santos, 38 anos, mãe de quatro filhos, quando acontece alguma morte na região, seja por assassinato ou acidente, logo os brasileiros são considerados suspeitos e passam a ser impedidos de ir e vir, sofrendo todo tipo de humilhação em forma de abordagem para revista e vistoria da casa.

“Uma forma de nos colocar para fora porque eles sabem que na verdade são os trabalhadores brasileiros que realmente plantam, trabalham com extrativismo e criação de animais. Os bolivianos tradicionalmente não têm coragem para tanto”, constatou.

Atos criminosos

Segundo a trabalhadora rural Maria das Dores, 53 anos, cinco filhos, nove netos e moradora do seringal há 30 anos, em alguns casos os bolivianos esperam as famílias saírem de casa para promover queima de campo e conseqüente incêndio da casa para que pareça acidente, a exemplo do que aconteceu com sua filha Maria de Nazaré.

“Foi um drama. Minha filha saiu para ir até minha casa e quando retornou no final da tarde só encontrou as cinzas da sua casa e dos seus pertences e o pior é saber que se trata de atitudes criminosas e não podemos fazer nada”, desabafou.

Impedidos

A saída dessas famílias do seringal boliviano foi encabeçada pelas mulheres, já que a maioria dos esposos precisou permanecer no local a fim de garantir uma forma de trazer os pertences, pois após sair não é mais possível retornar. Porto Rico fica há 40 quilômetros de Cobija e no posto policial boliviano, no quilometro 19, os policiais tem a determinação de não permitir a volta dos brasileiros.

“Se saímos não podemos voltar e mesmo que voltássemos não encontraríamos mais nada porque o saque de nossas casas é imediato”, afirmou a trabalhadora Maria Benedita lembrando que alguns familiares ainda estão lá para garantir que trarão pelo menos os objetos pessoais.

Medidas urgentes

O superintendente do Incra no Acre, Raimundo Cardoso de Freitas, explicou às famílias sem-terra que tão logo começou a divulgação das medidas por parte do governo boliviano, o Incra se antecipou com adoção de medidas realizando encontros, inclusive envolvendo a diplomacia dos dois países, movimentos sociais e prefeitos.

Sobre a questão que mais interessa, áreas para assentamento, Cardoso assegurou que existem três áreas já devidamente vistoriadas e o compromisso é agilizar para assegurar a esses brasileiros a dignidade que lhes é de direito.

“Não podemos ficar parados diante da situação de humilhação a que esses brasileiros estão expostos e precisamos estar preparados para receber os demais”, defendeu.

Durante o encontro com as famílias, ainda na sede do Incra, contando também com a participação da bancada de vereadores de Brasiléia, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Rosildo Rodrigues e gabinete do deputado Nilson Mourão, foi definido um local provisória digno para abrigar as famílias e apoio na alimentação. A desocupação da sede do Incra aconteceu ainda na tarde de ontem.